A moda da paternidade

Estou ensaiando escrever esse post há muito tempo, pois gosto de abordar as questões feministas pela ótica do homem. Veja bem, o feminismo não é o contrário do machismo, ou não é uma tendência que entende que mulheres devem ser contra homens. Entendemos — as feministas — que homens e mulheres devem compartilhar direitos e deveres, respeitados seus limites e diferenças físicas. Acreditamos que todos devemos ter o poder na cidadania tão igual quanto possível.

Compreendido esse pressuposto inicial, começo o texto, enfim. Com a moda da maternidade tão forte nos últimos tempos (ou simplesmente eu que cheguei na idade alvo e acho que todos procriam ao meu redor, mas é só um fenômeno da minha geração), não vejo muita gente falando sobre paternidade. Ao contrário, blogues com mulheres dando depoimentos sobre a maternidade tem aos baldes. Num mundo mais feminista, precisamos saber o que, então, o homem poderia fazer, especialmente nos espaços que nunca foram deles, ou ainda, está na hora de os homens ocuparem os lugares que eram, antes, apenas das mulheres.

Graças a uma tendência por metodologia, percebi que, ao longo das gerações, existiam, principalmente, três tipos de pais (os que não participam nem in praesentia da vida dos filhos não estarão na categoria “pais”, nesse texto): os provedores, os que ajudavam e os que dividiam as tarefas de cuidado. Geracionalmente, os provedores eram os mais comuns na época de minha avó e os mais “pra frentex” na época de minha mãe ajudavam. Cortando um pouco a linearidade que eu esperava, não observo como tendência atual o cara que divide as tarefas com a mãe. Na verdade, tenho a impressão de que houve uma estagnação entre essas gerações e o mais comum é um pai bobo, que não decidiu sobre a paternidade (a decisão de ter filhos é da mulher emancipada) e que “ajuda” quando a mulher, sei lá, precisa tomar banho.

Bem, aqui já deu para perceber que o tipo “que ajuda” é, para mim, o mais problemático, pois o que divide, ok, está de acordo com como penso e o provedor surge de um acordo machista entre ele e a mulher (e ninguém nesse caso parece se incomodar com esses papéis bem definidos). Para mim, o cara “que ajuda” é um idiota ou um cara idiotizado (sem ofensas), é um cara que foi escolhido para “quebrar um galho” e se acomoda em ser segundo plano, mas verbaliza outra coisa. Sempre tenho pena do cara quando escuto alguém perguntar para uma mãe: “e como fulano é como pai?” e ela responde: “nossa, ele me ajuda muito!”. Sinceramente, parece, para mim, que o cara vai lá ocupar seu lugar de coadjuvante e a mulher como responsável pela criança continua fazendo praticamente o mesmo que a mulher do provedor, mas com ares de modernidade e com a bobice de pegar no colo, jogar no ar uma vez e levar para a mãe, pois não sabe mais o que fazer com a criança.

O argumento para essa “ligação fortíssima” entre a mãe e o bebê é a amamentação. É verdade que é fácil gostar do seu alimento, principalmente quando se tem dias de vida. Mas a amamentação não precisa ser realizada apenas pela mãe: se o cara quiser, dá um incremento à natureza e participa do momento da alimentação. Daí falam que é uma relação primitiva a de mãe e bebê e fico procurando os tacapes da casa, por que, né? Acredito que a ligação fortíssima tem uma explicação, sim, e se chama “licença maternidade”, em que a mulher fica 24h com a criança nos seus primeiros seis meses e o pai fica esse tempo apenas na primeira semana. Mas para uma pessoa que “aceitou” ser o segundo plano na geração de uma nova pessoa e não decidiu exatamente sobre isso, essa falta de maturidade ou falta de ser adulto é, até, esperada; então, não será o tempo o único marcador de que o cara será um ajudante, não um co-protagonista.

Daí o cara vai ser pai. E quer ser tão protagonista dessa aventura quanto a mãe. O que fazer? Tem de aprender a ser pai. Nós somos ensinadas desde pequenas. Fico impressionada do quanto sei sobre gestações e questões relacionadas, só por ouvir dizer. Se ficasse grávida, mesmo que fosse tudo novo — e, provavelmente seria, pois as vivências são bem particulares — eu já teria tateado, ou já teria “ouvido falar” dos fenômenos relacionados. Homens não. Homens precisam de manual de instruções (se não quiserem ser ajudantes ou provedores), porque ninguém diz a eles o que acontece, o que fazer ou como fazer.

Para isso, louvo alguns trabalhos de divulgação da paternidade. Isso soa estranho, pois a paternidade existe desde que mundo é mundo. Ah, mas a paternidade ativa precisa fazer sentido, assim como a maternidade já faz há muito tempo. Por mais que muita gente ache piegas, o blogue português “Duas para um” é um bom exemplo de um cara que conta qual é esse negócio de ser pai e de querer participar da vida da criança. O link está AQUI. O Piangers fez livro, TED e faz grande divulgação de seus textos sobre a paternidade, evitando maniqueísmos e colocando dilemas reais (eu acho, sei lá) na vida do cara que decide dividir a tarefa de educar e criar um piá. O link do Piangers está AQUI.

Não sei o que é ser mãe e nunca saberei o que é ser pai. Mas acredito que o pessoal que deseja procriar deveria pensar ativamente em como ser um adulto efetivamente influente na vida da criança. Deve ser uma tarefa muito difícil. Hercúlea. Mas quem topa estar junto e não ser estátua só na formatura e nos aniversários diz que é uma experiência muito profunda e emocionante.

Fui encontrar os meus

Eu e tu, que fomos ao manifesto no último dia 18, estávamos lá para nos encontrar. Principalmente, para saber que não estávamos sozinhos. Porque temos passado dias difíceis.

Após o episódio do mensalão — que sabemos que não era prática isolada, que sabemos que caiu no colo do PT, que sabemos que o PT poderia (e deveria) ter dado outra volta no caso, que sabemos que não governaria se apertasse, enfim –, começamos a ficar acuados. Nossos parentes e conhecidos passaram a nos provocar e abaixamos nossas cabeças. Se levantávamos, era para defender o Bolsa Família ou o Minha Casa Minha Vida. E fomos nos cansando. E fomos nos afastando.

Sabíamos que não éramos do PT, mas de esquerda, e entendíamos que criticar era preciso. Não queríamos ser a Venezuela — embora a respeitássemos. Simpatizamos com o PSOL, analisamos a conjuntura e fomos ficando mais acuados. Assumimos que a luta tem de ser pacífica, não somos fascistas, somos democráticos, temos de ouvir o contraditório, aceitar o contraditório e cansamos de argumentar. Quisemos, enfim, ser ponderados e equilibrados. Nos afastamos mais. Nos desiludimos uns com os outros.

Até que veio a eleição de 2014. A direita já se impôs em “nós” e “eles”. Os contra e os a favor da corrupção. E passamos a não admitir Aécim apontando o dedo. Descobrimos que o problema era o sistema político, que no sistema atual não existem éticos. Entendemos que reforma política era necessária. Enfim concluímos que empresa não dá doação para campanha, ela investe (ou por que será que a Friboi doou 5 milhões para a Dilma, mais 5 para o Aécim e outros milhões para o Eduardo Campos?). Votamos na esquerda só para evitar o PSDB, mas demos mais um passo longe de nós mesmos. Votamos dando explicação. Caímos no jogo da direita.

O (não) pensamento fascista ou o reducionismo de direita é um movimento latente no mundo. Parece que estamos numa crise brasileira, mas estamos conectados. Também a direita quer que a gente pense que “isso só acontece no Brasil”, pois é mais fácil achar um salvador da pátria à moda antiga com cara de moderno. Não estamos sós, mas achamos que estamos.

Desde 2014, baixamos a cabeça e custamos a entender que éramos muitos. Quando Dilma tentou negociar, espinaframos. Não éramos base, não éramos militância. Aliás, só entendemos alguma coisa quando a situação do tudo ou nada — que vem desde 2013-2014 — passou a depender de jogadas finais. Cansamos de ver arbitrariedade atrás de arbitrariedade judicial. Vazamentos seletivos ad eternum. Aceitamos, finalmente, que política não é de bons e maus, é de gente boa e ruim ao mesmo tempo. Estamos acuados, não falamos mais nada na internet, queremos ficar de bem com todos, brigamos com os amigos. Chegou o momento do tudo ou nada. Polarizou. Todos perdemos. Pronto, vem o impeachment.

Foi por tudo isso que fomos encontrar os nossos na sexta, dia 18. Nos tornamos lulistas e dilmistas novamente porque a alternativa a isso é muito mais sacrificante, porque acaba com a Constituição, porque dá vitória à perda de humanidade e de cidadania. Cansamos ao longo dos anos, mas nos cansamos, também, de estarmos acuados. Pode ser que tenhamos acordado tarde, mas nos olhamos, sexta, sem medo, e percebemos que, se houver a concretização do golpe, haverá reação. Não estamos dispostos a aceitar qualquer coisa que fira a democracia. O golpe só não foi concretizado porque ainda somos resistentes, ainda vigiamos. Lula, se resolver, não vai resolver como gostaríamos, mas é nosso braço de luta, é, junto com Dilma, nossa jogada final para a manutenção da democracia. Não há meio termo, não há equilíbrio. Dia 31 vou, novamente, encontrar os meus. Porque sentia saudades.

 

Enquanto escrevia o post, fiquei pensando em uma canção: “Caçador de mim”, do Milton. Principalmente por causa desses versos: “Por tanto amor / Por tanta emoção / A vida me fez assim / Doce ou atroz / Manso ou feroz / Eu, caçador de mim […] Nada a temer senão o correr da luta / Nada a fazer senão esquecer o medo / Abrir o peito a força, numa procura”. Achei que fizesse sentido. se não fizer, podes ficar com o Milton, que é um chuchu e dispensa comentários.