Fui encontrar os meus

Eu e tu, que fomos ao manifesto no último dia 18, estávamos lá para nos encontrar. Principalmente, para saber que não estávamos sozinhos. Porque temos passado dias difíceis.

Após o episódio do mensalão — que sabemos que não era prática isolada, que sabemos que caiu no colo do PT, que sabemos que o PT poderia (e deveria) ter dado outra volta no caso, que sabemos que não governaria se apertasse, enfim –, começamos a ficar acuados. Nossos parentes e conhecidos passaram a nos provocar e abaixamos nossas cabeças. Se levantávamos, era para defender o Bolsa Família ou o Minha Casa Minha Vida. E fomos nos cansando. E fomos nos afastando.

Sabíamos que não éramos do PT, mas de esquerda, e entendíamos que criticar era preciso. Não queríamos ser a Venezuela — embora a respeitássemos. Simpatizamos com o PSOL, analisamos a conjuntura e fomos ficando mais acuados. Assumimos que a luta tem de ser pacífica, não somos fascistas, somos democráticos, temos de ouvir o contraditório, aceitar o contraditório e cansamos de argumentar. Quisemos, enfim, ser ponderados e equilibrados. Nos afastamos mais. Nos desiludimos uns com os outros.

Até que veio a eleição de 2014. A direita já se impôs em “nós” e “eles”. Os contra e os a favor da corrupção. E passamos a não admitir Aécim apontando o dedo. Descobrimos que o problema era o sistema político, que no sistema atual não existem éticos. Entendemos que reforma política era necessária. Enfim concluímos que empresa não dá doação para campanha, ela investe (ou por que será que a Friboi doou 5 milhões para a Dilma, mais 5 para o Aécim e outros milhões para o Eduardo Campos?). Votamos na esquerda só para evitar o PSDB, mas demos mais um passo longe de nós mesmos. Votamos dando explicação. Caímos no jogo da direita.

O (não) pensamento fascista ou o reducionismo de direita é um movimento latente no mundo. Parece que estamos numa crise brasileira, mas estamos conectados. Também a direita quer que a gente pense que “isso só acontece no Brasil”, pois é mais fácil achar um salvador da pátria à moda antiga com cara de moderno. Não estamos sós, mas achamos que estamos.

Desde 2014, baixamos a cabeça e custamos a entender que éramos muitos. Quando Dilma tentou negociar, espinaframos. Não éramos base, não éramos militância. Aliás, só entendemos alguma coisa quando a situação do tudo ou nada — que vem desde 2013-2014 — passou a depender de jogadas finais. Cansamos de ver arbitrariedade atrás de arbitrariedade judicial. Vazamentos seletivos ad eternum. Aceitamos, finalmente, que política não é de bons e maus, é de gente boa e ruim ao mesmo tempo. Estamos acuados, não falamos mais nada na internet, queremos ficar de bem com todos, brigamos com os amigos. Chegou o momento do tudo ou nada. Polarizou. Todos perdemos. Pronto, vem o impeachment.

Foi por tudo isso que fomos encontrar os nossos na sexta, dia 18. Nos tornamos lulistas e dilmistas novamente porque a alternativa a isso é muito mais sacrificante, porque acaba com a Constituição, porque dá vitória à perda de humanidade e de cidadania. Cansamos ao longo dos anos, mas nos cansamos, também, de estarmos acuados. Pode ser que tenhamos acordado tarde, mas nos olhamos, sexta, sem medo, e percebemos que, se houver a concretização do golpe, haverá reação. Não estamos dispostos a aceitar qualquer coisa que fira a democracia. O golpe só não foi concretizado porque ainda somos resistentes, ainda vigiamos. Lula, se resolver, não vai resolver como gostaríamos, mas é nosso braço de luta, é, junto com Dilma, nossa jogada final para a manutenção da democracia. Não há meio termo, não há equilíbrio. Dia 31 vou, novamente, encontrar os meus. Porque sentia saudades.

 

Enquanto escrevia o post, fiquei pensando em uma canção: “Caçador de mim”, do Milton. Principalmente por causa desses versos: “Por tanto amor / Por tanta emoção / A vida me fez assim / Doce ou atroz / Manso ou feroz / Eu, caçador de mim […] Nada a temer senão o correr da luta / Nada a fazer senão esquecer o medo / Abrir o peito a força, numa procura”. Achei que fizesse sentido. se não fizer, podes ficar com o Milton, que é um chuchu e dispensa comentários.