Exigências profissionais e garantia de direitos

Hoje, 19 de julho, meus colegas, professores estaduais, e eu assistimos a uma videoconferência proferida pelo secretário da Educação, Professor José Clóvis de Azevedo. O debate foi muito interessante, pois versava sobre muitos pontos em que a Escola, como instituição, precisa dominar e compreender para, efetivamente, cumprir seu papel social. São exigidos dos professores novos conhecimentos, novas técnicas e diferentes abordagens, que não seria exagero afirmar que o Secretário aponta a necessidade de uma revolução no campo da Educação. E isso parece muito positivo, ainda que inicialmente possa soar utópico.

O Secretário falou sobre uma série de coisas que competem a mim, como educadora, e foi muito didático ao explicar o que espera de seus professores, da rede como um todo e dos gestores, inclusive dele próprio.

Ainda hoje telefonei para a Divisão de Pagamentos do Estado, órgão da Secretaria da Fazenda, e solicitei o andamento de uma convoção para 20h que desde março deveria constar em meu salário (trabalho 40h, sendo que 20h são de uma nomeação e as outras 20h são de uma convocação solicitada em março), ou seja, tenho recebido, desde então, metade do meu salário, considerando minha carga horária semanal. Descobri que continuarei sem receber, porque mais uma vez (entre uma porção de outras vezes) houve problemas com informações minhas no sistema de RH. Nesse sentido, senti-me apta para devolver a responsabilidade ao Professor José Clóvis: poderia o senhor exigir de sua equipe administrativa o que espera de seus professores?

Comecei a trabalhar como professora da rede estadual há 12 anos, com 18 anos. Gosto do trabalho e sou bastante envolvida com o que faço. Cumpro minhas atribuições, mas não recebo o pagamento para aquilo que o secretário chama de dádiva, vocação. Meu trabalho é apenas um trabalho e deve ser pago. Não é vocação. Não é dádiva. Não é voluntariado. É trabalho e, com orgulho, vivo dele. Não estou discutindo como meu soldo é pequeno. Nem estou dizendo que é preciso valorizar o professor, inclusive financeiramente. Estou falando algo anterior, que está muito além dessa discussão: há um direito que, por confusões da própria Secretaria de Educação, eu não tenho usufruido. Meus direitos mínimos, como trabalhadora, estão sendo violados.

As desculpas se arrastam há meses; todas as vezes que solicitei informações junto à Secretaria, tive a clara impressão de que a pessoa que me atendia estava fazendo um favor para mim, como se não fosse obrigação que o órgão público fosse transparente com o pagamento de seus funcionários. As informações eram todas desencontradas e transcorreram-se mais de quatro meses até que funcionários da Divisão de Pagamentos tivessem notícias dessa convocação. O fato é que, nessa divisão, houve negação do direito ao salário integral (de 40h, não de 20h), pois o que ocorreu foi uma falha nas informações da Secretaria da Educação para tal departamento. A negação foi dada e nada foi feito: ninguém averiguou, ninguém corrigiu a falha, ninguém me avisou de nada – nem que eu ficaria mais um mês sem o salário integral.

É lógico que não há coerência nenhuma em comparar instituições educativas com empresas: são de naturezas, finalidades e diferentes ordens, como disse o Secretário hoje. Mas a responsabilidade com a execução de direitos trabalhistas, sim, é um fato comparável. Tanto o poder público como o privado têm o dever de cumprir suas obrigações trabalhistas e respeitar seu funcionário conforme sua competência. Se uma empresa não paga o salário de um funcionário durante cinco meses, ela será notificada, haverá alguma punição judicial, alguma multa incidirá sobre o dano. Mas, se o Estado – por sua própria confusão administrativa – não paga cinco meses de salário, o que acontece? Como pode ser considerada normal essa violação de direito? Como é possível que se demore tanto para efetivar o pagamento de um funcionário da Secretaria?

Quando comento o assunto na Escola onde trabalho, identifico uma situação mais estarrecedora: a demora de pagamento é considerada normal. Uma grande parte de meus colegas relatam situações tão graves ou piores do que a minha. Todas as vítimas entendem que “é assim mesmo…”; nesse sentido, não há orientação política melhor, pois, há anos, todos os partidos que nos governaram resolveram as questões de RH da Secretaria de Educação com alguma incompetência dessa ordem. Infelizmente, não consigo ver a normalidade da situação, não sou capaz de pensar que uma violação de direitos tenha de ser considerada.

A empatia e o engajamento por parte dos professores são atitudes que somente podem ser exigidas pela Secretaria da Educação quando houver uma relação de decência e respeito aos docentes. Enquanto formos tratados como gado por nossos pares (as pessoas que trabalham na SEC, em geral, também são professores), não há motivo para confiança e consequente adesão aos projetos pensados para a Educação de nosso Estado. Sinto-me incapaz de aderir às ideias de uma Secretaria que diariamente desconsidera e desrespeita minha carreira e o pagamento de meu salário, direito inquestionável.